Gestante

Não jogue a gordura fora

02/07/2017

Não estou falando daquela gordura que não deve ser jogada na pia, mas sim daquela proveniente do corpo humano. Os avanços nas pesquisas com células-tronco estão apontando seu uso terapêutico para o tratamento de uma lista enorme de doenças. E não é para um futuro muito distante: já é realidade!!

O tecido adiposo é rico em um tipo especial de célula-tronco chamada mesenquimal. O que está se descobrindo é que essas células, mais do que a capacidade regenerativa, possuem propriedades anti-inflamatórias e imunoreguladoras que podem ter aplicação no tratamento de inúmeras condições como artrite, regeneração de cartilagem, fraturas ósseas, infarto do miocárdio, doenças pulmonares, doenças auto-imunes, queimaduras de alto grau, entre outras. Não é a toa que são chamadas por muitos de “farmácias particulares”.

Em todo o mundo os estudos avançam, sendo que alguns usos já foram aprovados pelos órgãos reguladores como o FDA (Food and Drug Administration) nos Estados Unidos. Outros estão em estágio avançado de pesquisas, podendo trazer ao mercado outras aplicações destas células nos próximos anos. Isso significa que em breve estarão à disposição de todos nós. As perspectivas são muito boas! Não é à toa que, cada vez mais, o progresso científico da área e as inúmeras aplicações já aprovadas estão levando os pacientes mais antenados a procurar o serviço de armazenamento de células-tronco mesenquimais de tecido adiposo obtido a partir de cirurgias de pequeno e médio porte.

Quem tem mais de 30 anos provavelmente não armazenou células-tronco do tecido do cordão umbilical ou da polpa do dente de leite. A boa notícia, é que é possível encontrar células-tronco mesenquimais, em grande quantidade, no tecido adiposo. Por isso, aquele material que seria descartado em uma cirurgia de lipoaspiração ou num pequeno procedimento cirúrgico pode ser valioso para um possível uso futuro daquela pessoa. Nosso grupo de pesquisadores foi o primeiro no Brasil a demonstrar que o tecido (e não o sangue) do cordão umbilical é muito rico em células-tronco mesenquimais e a comparar seu efeito terapêutico com as células-tronco do tecido adiposo. Essas pesquisas foram publicadas em inúmeros trabalhos nas mais renomadas revistas científicas do mundo. Estamos no momento investigando o potencial dessas células para o tratamento de doenças graves e sem cura, como as Distrofias Musculares. Nossos resultados, em modelos animais, têm demonstrado que as células-tronco humanas obtidas da gordura tem um efeito clínico muito mais significante do que as células isoladas de outras fontes. Somado ao fato que o tecido adiposo é de fácil acesso e pode ser obtido em grande quantidade, essas células têm um potencial enorme para uso em futuras terapias.

O procedimento de coleta é bem simples. Nos casos de lipoaspiração, por exemplo, as células-tronco mesenquimais são isoladas a partir da gordura que seria descartada. Além disso, as células-tronco mesenquimais podem ser obtidas a partir de qualquer amostra pequena de gordura excedente de procedimentos cirúrgicos, ou até mesmo a partir de técnicas minimamente invasivas como uma simples biópsia no consultório médico. Só para se ter uma idéia, um grama de tecido adiposo chega a ter até 500 vezes mais células-tronco mesenquimais quando comparado com um grama do aspirado da medula óssea.

A facilidade de obtenção, aliada ao fato de as células-tronco mesenquimais serem muito mais versáteis, abre um leque enorme de oportunidades para futuras aplicações. Mas, vale lembrar, que quanto mais jovens melhores serão as células, pois menor será sua exposição às ações do ambiente e da idade pois elas podem acumular erros no DNA e comprometer o seu potencial de proliferação e diferenciação nos mais diversos tecidos.

É importante as pessoas tomarem conhecimento dos avanços científicos associados as células-tronco que podem advir de um processo fácil e acessível de coleta. Cabe a nós, pesquisadores, divulgar estas descobertas e nosso entusiasmo de ver a Ciência caminhando para o tratamento bem sucedido de problemas que assolam a humanidade há muito tempo.

*Mayana Zatz, geneticista, Diretora do Centro de Pesquisas sobre o Genoma Humano e Células-tronco da USP (Universidade de São Paulo) e consultora científica da StemCorp

www.stemcorp.com.br